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domingo, 2 de novembro de 2025

SAIU NO CORREIO BRAZILIENSE

Cidade Nossa: Sua Santidade, o celular

Neste domingo (2/11), o jornalista Cláudio Ferreira reflete sobre o uso excessivo do celular e a necessidade de repartir o tempo entre a vida real e a virtual

REV-0211-CRONICA -  (crédito: maurenilson)

Cláudio Ferreira — especial para o Correio 

Não quero ser o senhorzinho que lamenta os males da modernidade e que finaliza todas as conversas com a frase: "No meu tempo...". Mas ando assustado com o protagonismo que o celular assumiu nas nossas vidas, para o bem e para o mal.

Brasília ficou estarrecida com dois fatos recentes que envolveram o uso do celular. O primeiro foi a morte de um rapaz de 16 anos esfaqueado ao tentar recuperar o aparelho roubado por outros adolescentes. Em outro, um professor foi espancado por um pai de uma aluna que reclamou por ter sido advertida ao usar o celular em sala de aula.

Foram dois momentos de barbárie — uma morte e uma agressão violenta — que mostram como esse objeto de desejo virou personagem central, gerando atitudes que desprezam os princípios básicos da ética da civilização. São exemplos extremos, é verdade. Mas temos outras situações na vida cotidiana que mostram esse protagonismo.

É difícil, atualmente, para o motorista brasiliense, parar em uma faixa de pedestres sem que alguém esteja atravessando olhando o celular, sem prestar atenção ao que está acontecendo no entorno. Como diz um amigo com certo sarcasmo, "morre sem nem saber como".

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Falando no trânsito, o celular não está só na mão do pedestre. O motorista já o incorporou definitivamente. Pode ser quando o semáforo está vermelho e um exército aproveita para checar mensagens. Pode ser também — pior ainda — durante o trajeto, falando e teclando. Dá pra reconhecer o motorista que não larga o celular: o carro fica titubeando na pista, quase indo de uma faixa para outra e o cidadão ainda fica com raiva se você buzinar para tentar proteger o seu carro de um acidente.

O celular também tem papel importante numa academia. Repare nos frequentadores: todos estão com o aparelho em punho. Alguns, é verdade, verificando a série de musculação que o personal trainer passou. Mas muitos não conseguem ficar um minuto — o intervalo entre uma série e outra — sem saber o que está acontecendo com a sua rede de contatos. Rolam a vida dos outros enquanto esperam para retomar o exercício.

Nos bares e restaurantes, não é raro termos mesas com várias pessoas que não estão fazendo companhia umas às outras; cada uma tem o olhar fixo no celular, angustiada pela sensação de estar perdendo o melhor da vida virtual, enquanto a vida real espera ali, enquanto a comida não chega.

Entendo perfeitamente esse fascínio pelo celular. A vida na internet é muito atraente, com novidades a cada segundo, aventuras a se cobiçar, produtos a se conhecer, fofocas a rodo, vídeos engraçados, cancelamentos, etc... De vez em quando, eu me pego passando mais tempo no celular do que gostaria, mas a rede social me relaxa e o aplicativo de mensagens me lembra a toda hora que pode haver algo essencial a saber.

O desafio é o equilíbrio. Repartir o tempo entre a vida real e a virtual. Valorizar as companhias presenciais em detrimento do que está mais distante. Colocar cada coisa em seu lugar, aproveitando o melhor de tudo. Difícil, não é?

  

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