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domingo, 16 de janeiro de 2022

COLUNA DA SEMANA

Não me canso de registrar minha estupefação, repelir juntamente com guardar o sentimento de revolta, que aproxima de descrédito na Justiça, quando relembro do julgamento de um Habeas Corpus no qual se buscava a suspeição do então juiz Sergio Moro. Este Habeas Corpus, vejam bem um Habeas Corpus, permaneceu no gabinete do ministro Gilmar Mendes, responsável pela interrupção do julgamento com pedido de vista, por dois anos. Mendes pediu vista, porque os ministros Edson Fachin e Cármen Lúcia votaram pela improcedência da suspeição. Amparou o Habeas Corpus no seu gabinete, por dois anos, vez que o julgamento iniciou-se em 2018. Se esse cenário fosse nos tribunais de justiça o desenrolar dessa mixórdia seria outra completamente diferente, pois não se justifica tamanho descuido e desrespeito ao direito com um processo, ainda mais quando se trata de Habeas Corpus. Mas a perplexidade não se limitou a este fato, porquanto outras parvoíces foram registradas.

O ministro perpetuou em seu gabinete um Habeas Corpus, por dois anos, na expectativa de encontrar ambiente e julgadores aptos a seguir sua pretensão, anunciada com frequência pela imprensa. Neste período conseguiu demover a ministra Cármen Lúcia a mudar seu voto, proferido na primeira sessão. Este é um ministro que não se intimida nem lhe constrange em antecipar votos pela imprensa, que não se envergonha em ser questionado por suspeições, que nunca são julgadas na Corte, que não se inquieta em ser interpelado no Senado, através de impeachment, que não se estorva em ser condenado por agredir a juízes e que não se encavaca em ser vaiado, pelo descrédito no qual é jogado como juiz. Este é o ministro Gilmar Mendes!

Mas vamos com o final do julgamento do Habeas Corpus. O ministro aguardou tornar-se presidente da 2ª Turma do STF, esperou o substituto do ministro Celso Mello assumir a cadeira vaga e mais ofuscou o momento certo para o golpe que não mereceu reprimenda de seus colegas. Isso é vergonhoso: como aceitar calado, como ficar reticente em tão grande desrespeito às leis e aos próprios colegas?!

O desfecho deste entristecedor caso deu-se em abril/2021. O ministro Edson Fachin julgou a 13ª Vara Federal de Curitiba incompetente para julgar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, depois que os julgamentos foram mantidos pelo Tribunal Regional Federal do Rio Grande do Sul e pelo STJ em Brasília; determinou a remessa dos processos para Brasília; face a este entendimento, julgou extinto o Habeas Corpus, guardado a sete chaves pelo ministro Mendes e não podia ser outro o entendimento, pois se admitiu a incompetência da Vara, claro que não tem sentido julgar exceção de suspeição, mesmo porque o juiz foi dado por incompetente, antes da apreciação da suspeição. É o que se denomina de perda do objeto. Mas o ministro Mendes queria porque queria julgar o Habeas Corpus da suspeição e, no dia seguinte ao julgamento de Fachin, na condição de presidente da Turma, sem aviso prévio, apresentou o Habeas Corpus para julgamento. Contou com a mudança do voto da ministra Cármen Lúcia, que, em 2018, julgou improcedente a suspeição, mas em 2021, certamente para agradar a Mendes, julgou procedente a suspeição.

Ora, se Moro é tornado incompetente, como julgar suspeição, considerada prejudicada pela mesma decisão da incompetência? Se há incompetência, como admitir suspeição do que já foi entendido como incompetente? É certo que a incompetência retirou a existência daquele juízo, daí porque não há como ser suspeito. A conclusão lógica e natural é que nunca Moro poderia ser suspeito, porque, antes da suspeição, ele foi considerado incompetente. Mais uma vez: se Moro não era competente para julgar, como vai ser classificado de suspeito? Se não podia julgar, porque incompetente, como suspeição, se esta não convive sem um juízo competente.

Mas o ministro Gilmar, como presidente da turma pautou e julgou o Habeas Corpus de dois anos antes, pois precisava satisfazer ao ex-presidente e não se contentou com o pronunciamento da incompetência. Queria e tornou-se o figurão dessa macabra história.

Salvador, 16 de janeiro de 2022.

Antonio Pessoa Cardoso
Pessoa Cardoso Advogados.

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