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sábado, 28 de novembro de 2015

1968, O ANO QUE NÃO TERMINOU

O jornalista Zuenir Ventura viveu o drama da ditadura no Brasil e descreve, com pormenores, as brutalidades e crimes praticados pelos militares contra os estudantes, os intelectuais e o povo em geral. O livro foi publicado pela Objetiva e a leitura é recomendada principalmente para quem pede a volta dos militares nesses momentos de crise que atravessa o país. 

Ivan Lessa dizia que “a cada 15 anos, esquecemos os últimos 15 anos”, daí porque indispensável tomar conhecimento da luta dos estudantes pela democracia, cujas entidades foram postas fora da lei em 1964, bem diferente dos tempos atuais, quando não se ouve falar em UNE, salvo para apoiar o que está errado, em troca de favores financeiros. 

Naquela época, a inflação rodava 40%, os sindicatos estavam sob intervenção, e, nesse cenário, os intelectuais criaram “Terra em Transe”, “Quarup”, o “Tropicalismo”, “Alegria, Alegria”, “A Banda”, “O Rei da Vela”, “Liberdade, Liberdade” e o “Poder Jovem” ensaiava a tomada do poder. 

Os estudantes liam e admiravam Marx, Mao Tse Tung, Guevara, Debray, Lukács, Gramsci, James Joyce, Hermann Hesse, Norman Mailer, Marcuse. Todos buscavam apoio na leitura dinâmica para ler mais e mais livros. 

Vigorava nesses anos a denominação de esquerda para os estudantes que comungavam com os novos ideais; depois de 64, apareceu a esquerda festiva, aquela que recorria às festas para se manter na onda. Era o tempo de Vinicius de Morais, Tom Jobim, Carlinhos Oliveira, Otto Maria Carpeaux, Carlos Castelo Branco, Chico Buarque, Jaguar, Stanislaw Ponte Preta. 

Definia-se a televisão brasileira, ainda em preto e branco, como a “maquina de fazer doido”. 

Em 1968, estudantes, intelectuais buscavam derrubar a ditadura, implantada com o golpe militar de 1964. Os slogans nas ruas incluiam o de que “Só o povo armado derruba a ditadura” ou “Só o povo organizado derruba a ditadura”. O PCB, o PC, a UME, a AP, a UNE comandavam os jovens nas ruas contra a ditadura. Formavam-se movimentos para lutar contra o poder arbitrário dos militares. 

Um estudante secundarista, 18 anos, recém chegado no Rio de Janeiro, Edson Luis, sem biografia nenhuma que lhe vinculasse aos movimentos estudantis, jantava no restaurante Calabouço, dos secundaristas, quando o local foi invadido pela polícia, culminando com um tiro no peito do estudante que morreu. O Rio de Janeiro parou, o corpo do morto, que se tornou mártir, foi velado na Assembleia Legislativa, na Cinelândia, e mais de 50 mil pessoas compareceram ao seu sepultamento.

Os movimentos estudantis proliferavam e o presidente Costa e Silva, sob pressão de seus comandados, editou o Ato Institucional n. 5, diante das gigantescas movimentações dos estudantes, que apanhavam e aprenderam a bater, agredindo os policiais com paus e pedras. Na missa de sétimo dia, pela alma de Edson Luis, na Candelária, recrudesceu o movimento, mas, apesar das ameaças de suspensão, houve a missa, com a igreja lotada de estudantes e intelectuais, mas cercada por militares. 

Dom Castro Pinto, vigário geral do Rio de Janeiro, lembrava que de todas as cerimônias realizadas na igreja, nenhuma foi tão tensa e dramática como essa.

Esse desassossego dos jovens não era peculiar ao Brasil, pois, na França, os estudantes promoveram verdadeira revolução, nas ruas de Paris. O maio francês, quando foram realizados movimentos de protestos dos estudantes, em Paris, era temido que chegasse no Brasil. Em junho/1968, na denominada sexta feira sangrenta, as barricadas, as batalhas campais pareciam uma inssureição popular contra a ditadura, comandada por Costa e Silva. Os estudantes gritavam: “Você, que é explorado, não fique aí parado”.

Mas o movimento não parava; na semana seguinte, veio a passeata dos 100 mil, quando padres, freiras, professores, intelectuais estudantes e o povo em geral foram aplaudidos por quem estava no alto dos edifícios. Em Brasília, seguiu-se a ocupação da UNB e veio o que faltava para os militares acabar com toda liberdade, fechar congresso, cassar políticos e magistrados. 

O líder do maior movimento estudantil, Vladimir Palmeira, declarava: “Fomos presos, torturados, mortos, exilados e não conseguimos chegar a lugar nenhum”. 

O discurso do deputado Márcio Moreira Alves, pregando boicote ao 7 de setembro que se aproximava, foi o estopim para o AI-5; no Congresso, em certo momento, o parlamentar disse: Este boicote pode passar também às moças, às namoradas, àquelas que dançam com os cadetes e frequentam os jovens oficiais. Pedia para as mulheres negar sexo aos maridos. Foi o pretexto para a edição do AI-5, que suprimiu a liberdade do cidadão, decretou recesso do Congresso, cassou o mandato de mais de 300 cidadãos, 6 senadores, 110 deputados federais, 161 estaduais, 22 prefeitos e 22 vereadores, afastou do STF os ministros Hermes Lima, Evandro Lima e Silva e Vítor Nunes Leal, além de censura a imprensa. 

Depois desse ato, as prisões encheram-se, muitos militantes foram torturados e mortos. Foi a história negra do Brasil! 

Quando um militar deu ordem de prisão ao carajoso advogado Sobral Pinto teve como resposta:

- Preso coisa nenhuma! 

Sobral, na prisão, convocado para prestar depoimento respondeu:

- Não vou, não tenho que prestar depoimento nenhum. Vocês me arrastem, mas eu não vou.

Quem quiser saber as ocorrências do movimento militar de 1964, mas principalmente das desventuras registradas em 1968, não pode deixar de ler o livro de Zuenir Ventura que viveu e participou do movimento contra a ditadura. 

Salvador, 28 de novembro de 2.015.

Antonio Pessoa Cardoso.
Pessoa Cardoso Advogados.

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