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quinta-feira, 8 de junho de 2023

O STF RECEBE E ANULA RECEBIMENTO DE DENÚNCIA

É incompreensível jurídica e moralmente o posicionamento do STF e da Procuradoria-Geral da República na contraditória absolvição do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, que se deu na terça-feira, 6. A inusitada manifestação da Procuradoria e o despropositado acórdão de arquivamento do processo criminal não deveria surpreender a ninguém, porquanto há antecedentes, na Operação Lava Jato, a exemplo da nulidade dos processos contra o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em nulidades de processos contra o ex-governador Sérgio Cabral, na absolvição do ex-governador Fernando Pezão e tantos outros processos criminais da Lava Jato. No caso de Lira, houve a sinalização sobre o caminho que o STF iria trilhar, em 2021, quando também rejeitou denúncia recebida, no denominado "Quadrilhão do PP". No episódio do início desta semana, a denúncia foi recebida em 2019 e um recurso meramente protelatório, embargos de declaração, foi protocolado e rejeitado pela maioria da Turma, mas o ministro Dias Toffoli apressou-se e antes de terminar a sessão pediu vista, para segurar o processo pelos quase três anos que se seguiram. 

Vejam a excentricidade do cenário: o ministro Dias Toffoli pediu vista, depois que todos os seus colegas votaram pelo recebimento da denúncia, em simples Embargos Declaratórios, e segurou o processo estudando, analisando, buscando ensinamentos doutrinários e jurisprudenciais para devolver o processo, sem aplicação do que aprendeu nesses quase três anos; no final da rocambolesca história consumou-se o retrocesso do atalho encontrado para anulação de denúncia recebida, anos atrás. O leitor é chamado para imaginar ocorrência dessa natureza, tão paradoxal, desenrolar-se na sua comarca ou no Tribunal no seu Estado: o Ministério Público apresenta denúncia, que é recebida pelo juiz ou pelo Tribunal, mas eis que desabrocha um  recurso de embargos declaratórios e todos os componentes da Câmara rejeitam os embargos, mas um desembargador pede vista, no final da sessão, e, como que, por encanto, os anos passam e nada mais se fala sobre os embargos. O que aparece depois de três anos e meio, é o não recebimento da denúncia que já tinha sido recebida anos atrás, seguida da insólita absolvição do criminoso.

A arquitetura para rejeição da denúncia, repita-se, já recebida, tornando Lira réu, foi aberta pela vice-procuradora geral da República, Lindôra Araújo, que, enigmaticamente, pediu, em abril/2023, desistência da denúncia, apresentada pela então Procuradora-Geral da República, Raquel Dodge, e recebida anteriormente, repita-se; o motivo apresentado para a brusca mudança foi simplesmente de ausência de justa causa, depois de apresentada a denúncia pela própria Procuradoria e após ter sido recebida pelos mesmos ministros da 1ª Turma. Quer dizer: não havia esse componente de justa causa, quando, em 2018, a então Procuradora Dodge apresentou a denúncia, e quando foi recebida pela 1ª Turma do STF, e esse elemento, como que brotou anos depois, em 2023, por ocasião da devolução do pedido de vista, nos Embargos, do ministro Dias Toffoli?! Para haver unanimidade no acórdão foi preciso o ministro Alexandre de Moraes modificar seu voto, antes pela condenação, e essa conduta do ministro não gerou nenhum constrangimento, porque usado com muita naturalidade. A arquitetura final consistiu em novo voto, oferecido pelo ministro recém chegado, André Mendonça, de conformidade com permissão dos componentes da Turma, desfazendo o que o ministro recém aposentado, Marco Aurelio Mello, fez no exercício de sua função. 

Mas em que consistiu o crime, que o Supremo disse não existir crime? Lira foi denunciado por ter recebido, em 2012, através de seu assessor Jaymerson José Gomes de Amorim, propina de R$ 106,4 do presidente da Companhia Brasileira de Transportes Urbanos, Francisco Colombo, que buscou apoio do parlamentar para permanecer no cargo, que ocupava na Companhia Brasileira de Trens Urbanos. O pagamento pela manutenção na direção da empresa deu-se no aeroporto de Congonhas, em São Paulo, passando o valor para as mãos de Jaymerson, que retornava para Brasília, quando apanhado em flagrante pela Polícia Federal. Assim, as provas contra Lira são contundentes, não se limitando à delação do doleiro Alberto Youssef, mas consistentes na apreensão do dinheiro, nas passagens pagas por Lira, em mensagens e telefonemas entre o assessor e o deputado, no dia da ocorrência, além de Francisco Colombo, que repassou o valor para o  Jaymerson

Salvador, 8 de junho de 2023.

Antonio Pessoa Cardoso
Pessoa Cardoso Advogados.



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