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segunda-feira, 5 de abril de 2021

A VIDA OU O CULTO?

O curso do tempo mostra decisões realmente estapafúrdias dos ministros do STF. A última originou-se do ministro de Bolsonaro, Kassio Nunes, liberando os cultos e missas presenciais em todos os recantos do Brasil, sem observar as diferenças regionais de maior ou menor gravidade da covid-19. A fuga à lei, aos fatos e à ciência é gritante. Inicialmente, registre-se o erro do ministro ao aceitar uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental da Associação Nacional de Juristas Evangélicos. É que, recentemente, em fevereiro/2021, o Tribunal, em voto do ministro Alexandre de Moraes, à unanimidade e com voto de Nunes, definiu que esta Associação não tem legitimidade para pleitear a medida judicial. A Corte decidiu que a ANAJURE é composta por "associados não vinculados a uma única e homogênea categoria profissional ou econômica".   

A justificativa do ministro para conceder a cautelar, entendendo que a Associação preenche os requisitos, não subsiste, porque tanto a ação anterior, como a de agora guardam absoluta semelhança no pedido acerca de medidas municipais para enfrentar o vírus. Enfim, além dos argumentos jurídicos para inviabilizar a decisão de Nunes, não se compreende como, no pior momento da pandemia, liberar os cultos religiosos presenciais, quando o próprio STF concedeu aos prefeitos a competência concorrente para legislar sobre o assunto, exatamente, visando garantir as diferenças entre os municípios brasileiros, acerca da maior ou menor mortes face ao coronavírus. O ministro de Bolsonaro emprestou, com sua decisão, maior valor à liberdade religiosa do que à vida. Aliás, esta é a pregação de seu patrono, responsável pelas mais de 330 mil pessoas mortas, sempre reclamando contra as restrições impostas pelas autoridades locais. A decisão do ministro implica acreditar que os beneficiados da ação não merecem maior proteção contra o vírus, porque são protegidos pela atuação divina. 

A conclusão que se tira deste pronunciamento monocrático de Nunes Marques é que ela usa a toga não em função de seus méritos, mas para atender recomendações de quem lhe indicou para o cargo. Aliás, até o momento não causa nenhuma surpresa, pois outras decisões do ministro prestaram-se para obedecer ao ritual ao qual se submeteu para conseguir assento na Corte. O recente voto de Nunes julgando improcedente a suspeição de Moro seguiu a linha do raciocínio apresentado desde o inicio, quando, em liminar, derrubou o entendimento da Corte, cortando trecho da lei da Ficha Limpa: "após o cumprimento da pena". Que dizer da votação para aceitar a reeleição do então presidente do Senado, Alcolumbre, e impedir o ex-presidente da Câmara Maia! 

Enfim, o presidente ignorou o passado do ministro, acusado de questionamentos no currículo, de plágio, por inserir curso no currículo, desmentido pela Universidade de La Coruña, mas prestigiou a esperada fidelidade, que se comprova com o passar das decisões. Mas é a sina do STF, por mágica, mudar o conceito de reputação ilibada. Usa-se a borracha para limpar as maldades do currículo, tornando o novo ministro imaculado.    

Guarajuba/Camaçari, 04 de abril de 2021.

Antonio Pessoa Cardoso
Pessoa Cardoso Advogados. 




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