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segunda-feira, 28 de abril de 2025

SAIU EM O ANTAGONISTA

A ressignificação da toga 

Ministros do STF transformaram símbolo tradicional de impessoalidade e imparcialidade em um adereço para ostentar poder

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Duda Teixeira
3 minutos de leitura27.04.2025 09:58 comentários 4

Barroso, Gilmar e Dias Toffoli. Fotos: Antonio Agusto e Rosinei Coutinho Flickr/STF

 toga, criada ainda na Roma Antiga, começou a ser usada nos tribunais da Idade Média como um símbolo de impessoalidade e imparcialidade.

mensagem era que, uma vez que o juiz a vestia, ele deixava de ser a pessoa que todos conheciam e passava a julgar os casos de maneira neutra, baseado apenas nas leis.

Foi adotada, portanto, para ser usada como um uniforme, que elimina os traços pessoais — dos ombros até o calcanhar — e valoriza a função dos que a usam, no caso, a de juiz.

Ainda é assim em vários países do mundo.

A foto abaixo é do Tribunal Constitucional Federal da Alemanha.

 

Tribunal Constitucional da Alemanha. Foto: Alliance/dpa

Basta comparar a imagem acima com a montagem de fotos desta nota para ver que Brasil e Alemanha estão em planetas diferentes.

O que os ministros do Supremo Tribunal Federal fizeram foi desvirtuar a função original.

Ou, talvez, eles tenham "ressignificado" a toga, para usar uma palavra da moda.

Em vez de ser um símbolo de impessoalidade e imparcialidade, os nossos magistrados transformaram a toga em um adereço qualquer, que eles usam como bem entendem.

Afinal, ninguém vai dizer para eles como devem usar a toga.

Os ministros do STF estão acima de tudo e de todos.

Se eles querem usar a toga como se fosse uma toalha em cima do ombro, não há quem possa detê-los. São intocáveis.

Se querem mostrar orgulhosos o terno caro que compraram durante um evento jurídico no exterior com empresários brasileiros, não há quem os possa impedir.

Se querem usar a toga como se fosse uma capa de super-homem, os fotógrafos correm para escolher o melhor ângulo.

Foi o que fez o deslumbrado fotógrafo Fábio Setti, que trabalhou para a revista americana The New Yorker.

Ao fotografar o ministro Alexandre de Moraes, Setti teve até o cuidado de colocar um fundo vermelho no fundo, em uma das opções de seu ensaio (depois apagado das redes sociais).

"Sob um fundo vermelho vivo, Alexandre de Moraes faz um movimento com a toga esvoaçante, está com os olhos fechados e a boca levemente aberta. Parece embriagado com o poder excessivo que lhe foi dado nos últimos anos", escreveu Josias Teófilo em uma coluna para Crusoé.

A maneira como os ministros do STF usam da toga é um reflexo do protagonismo excessivo da Corte, em que os juízes fazem o que bem entendem. Até mesmo cantar em festa abraçado com político. 

ESTADO É OBRIGADO A NOMEAR

O Estado da Bahia, em ação civil pública, requerida pelo Ministério Público, foi condenado pelo juízo da 8ª Vara da Fazenda Pública a nomear e dar posse a 37 aprovados no concurso público de 2013 para o cargo de Procurador do Estado. O fundamento foi de omissão do governo no preenchimento de cargos vagos com candidatos concursados, dando preferência para a contratação de servidores comissionados e temporários. O concurso de julho/2014 tinha 25 vagas iniciais e contou com aprovação de 265 candidatos. No curso do tempo, até 2018, ainda restavam 69 vagas não preenchidas. As contratações precárias com o Regime Especial de Direito Administrativo, REDA, além de nomeação para cargos comissionados prevaleceram. O governo informa que os candidatos aprovados foram nomeados e as contratações por REDA prestaram-se para atender a necessidades temporárias.  

O juiz Pedro Rogério Godinho escreveu na sentença: "Tais casos, consubstanciam hipóteses de inconstitucionalidades e ilegalidades que saltam aos olhos, posto que o vínculo contratual tido como emergencial, se prorroga no tempo de forma indefinida, confessando, portanto, o Demandado (Estado da Bahia), da efetiva necessidade do profissional atuando como Procurador do Estado, de forma permanente, impossibilitando a utilização do contrato REDA em situação continuada, assemelhando-se assim verdadeira nomeação, sem realização de certame". Adiante: "Por conseguinte, as exceções indicadas consubstanciam práticas vedadas em nosso ordenamento pátrio, as quais violam gravemente princípios basilares do nosso sistema constitucional como a legalidade, impessoalidade, moralidade e o acesso ao funcionalismo público, uma vez que o cargo e a carreira de Procurador Jurídico estava sendo ocupada por agentes que não realizaram o respectivo concurso público". O magistrado assegurou que o Estado deverá nomear e dar posse a 37 candidatos no cadastrado de reserva.       


 

 


  

 

 


ADI: LIMITE DE HONORÁRIOS

Em Ação Direta de Inconstitucionalidade, requerida pelo Associação Nacional dos Procuradores dos Estados e do Distrito Federal, contra o art. 1º da Lei estadual n. 19.849/2019, o STF declarou inconstitucional trecho de lei do Paraná, por ter limitado os honorários de procuradores do estado, em ação de execução fiscal. O dispositivo questionado mudou o paragrafo 2º da Lei estadual 19.802/2019, instituindo o teto de honorários em execuções fiscais, referentes ao Regime Diferenciado de Pagamento de Dívidas Tributárias estadual. A ANAPE defendeu a tese de que a fixação de honorários é competência dos julgadores e o limite estadual viola as regras definidas pelo art. 85 do CPC; assegurou que o parágrafo 19 do dispositvo, determina que "os advogados públicos perceberão honorários de sucumbência nos termos da lei", não autoriza o Legislativo a tratar do tema.    

A lei paranaense invadiu a competência privativa da União, fixada no art. 22 da Constituição, além de afrontar os parágrafos 1º e 4º do art. 24 da Constituição; todos eles conferem à União para definir normas gerais no âmbito de legislações concorrentes, além de garantir que essas normas gerais anulem as leis estaduais que as contrariem. A Advocacia-geral da União manifestou favoravelmente ao pedido da ANAPE e a Procuradoria-geral da República defendendo a norma estadual, entendendo que não há invasão de competência, porque a norma busca atrair contribuintes ao Refis. O ministro André Mendonça citou julgamento da ADI 7.014, quando o tribunal considerou usurpação de lei paranaense, porque matéria de competência privativa da União. O ministro reproduziu parte do voto do ministro Edson Fachin: "Acha-se consolidada na jurisprudência desta Corte a ideia de que os honorários compõem a remuneração de determinadas carreiras públicas, sujeitando-se, assim, ao teto constitucional".  



OAB: PROIBIÇÃO DE CELULARES

O presidente da OAB, Beto Simonetti, vai reunir com o ministro Cristiano Zanin, presidente da Primeira Turma do STF, hoje, 28, visando tratar da proibição do uso de celulares por advogados nos julgamentos da tentativa de golpe de Estado. Simonetti vai insistir no pedido de suspensão da providência adotada por Zanin, pegando a entidade dos advogados de surpresa, com grave violação ao exercício profissional. Essa drástica medida foi adotada na terça-feira, 22, quando se julgava a tentativa de golpe de Estado. Os celulares de advogados e jornalistas foram lacrados. Alex Sarkis, procuradora nacional de Prerrogativas do Conselho Federal da OAB, participará da audiência.

Na mesma data da ocorrência, a OAB remeteu petição ao ministro, assegurando que a determinação de lacrar os telefones importava em violação grave das prerrogativas dos profissionais. Disse a OAB: "Os direitos fundamentais consistem precisamente em limites ao desempenho de funções dos Poderes Púbicos, descabendo impor restrições à liberdade profissional com medidas e condicionamentos que atentam contra a liberdade de exercício profissional pelos causídicos". Prossegue: "Dese modo, requer o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil a reversão da orientação que determinou o lacre dos celulares dos advogados, assegurando o livre exercício profissional, permitindo-se o porte e uso de aparelhos celulares pelos advogados ao ingressarem e permanecerem nas dependências do Plenário da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal". 

 

MANCHETES DE ALGUNS JORNAIS DE HOJE, 28/4/2025

CORREIO BRAZILIENSE - BRASÍLIA/DF

Análise: Brasil ficou ingovernável com a anomalia chamada governo congressual

O deslocamento do poder de mando sobre a agenda de políticas públicas e a gestão orçamentária virou o presidencialismo de coalizão de ponta-cabeça

O GLOBO - RIO DE JANEIRO/RJ

‘Avisei Lupi dos problemas no INSS e ele nada fez’, diz ex-conselheira de órgão gestor da Previdência

Ministro alega que outras pessoas também o procuraram, mas eram necessários 'fatos concretos' 

FOLHA DE SÃO PAULO - SÃO PAULO/SP

Hegemonia católica no Brasil deve acabar até a próxima década, aponta projeção

Religião apostólica romana deve seguir tendência histórica de queda e ser ultrapassada por evangelicalismo até 2032

TRIBUNA DA BAHIA - SALVADOR/BA

Marçal recebe nova condenação de 

inelegibilidade e é multado em R$ 420 mil

O empresário, acusado de impulsionar irregularmente a campanha 

nas redes sociais e descumprir decisão judicial, recebeu 

nova inelegibilidade de oito anos

CORREIO DO POVO - PORTO ALEGRE/RS

Homem é preso em flagrante tentando roubar 

armas do Museu da FEB em Caxias do Sul

Ele tentava furtar três metralhadoras, dois fuzis e um sabre

DIÁRIO DE NOTÍCIAS - LISBOA/PT  

"Reconhecimento internacional" dos territórios ocupados "é imperativo" para negociar com Kiev, diz Moscovo 

O chefe da diplomacia russa refere-se a cinco regiões ucranianas, além da Crimeia. O porta-voz do Kremlin voltou a referir que a Rússia está pronta para negociar com Kiev "sem condições prévias".

domingo, 27 de abril de 2025

RADAR JUDICIAL

ATÉ QUE ENFIM, MINISTRO DECIDE

Até que enfim, o ministro Gilmar Mendes, do STF, desconfiou e desistiu de levar a julgamento no plenário físico, sobre a prisão do ex-presidente Fernando Collor de Mello. Mendes queria suspender o julgamento, apresentando destaque, para levar para o plenário físico o julgamento da manutenção da prisão, mas a maioria votou para manter a prisão do criminoso Collor, que está preso desde a sexta-feira, 25. Votaram para manter a prisão os ministros Alexandre de Moraes, Flávio Dino, Edson Fachin, Luis Roberto Barroso, Cármen Lúcia e Dias Toffoli. Faltam os votos dos ministros Luiz Fux, Kassio Nunes Marques e André Mendonça, que não mudará a decisão final. O ministro Cristiano Zanin declarou-se impedido. 

EX-PRESIDENTES PRESOS NO BRASIL

Fernando Collor de Mello, preso por decisão do ministro Alexandre de Moraes, do STF, tornou-se o terceiro ex-presidente preso nesses últimos 40 anos. Nesse período, oito foram os Presidentes eleitos, sendo que três deles foram presos. Em 230 anos de sucessões presidenciais, os Estados Unidos não tiveram nenhum presidente preso. Os ex-presidente do Brasil, que foram presos, responderam ou eram acusados de corrupção. O ex-presidente Michel Temer esteve durante nove dias em prisão cautelar, no ano de 2019; o presidente Luiz Inácio Lula da Silva permaneceu na prisão por 580 dias, em cela especial na Polícia Federal de Curitiba. O terceiro, Fernando Collor de Mello, está preso porque condenado a 8 anos e 10 meses de reclusão. Jair Bolsonaro poderá tornar-se o quarto ex-presidente preso, pela prática de vários crimes, entre os quais, conspiração contra a democracia no país.  

PASTOR É DEMITIDO

O pastor Valdinei Ferreira foi demitido da Faculdade de Teologia da Igreja Presbiteriana Independente do Brasil, FATIPI, sob fundamento de ele ter publicado um artigo, sob o título "Judas traiu Jesus ou Jesus Traiu Judas". Ferreira assegura que houve exploração com a hipótese de que ele teria considerado Jesus o traidor. A Fundação Eduardo Carlos Pereira, mantenedora da FATIPI, em nota, diz que o pastor foi excluído depois de avaliação regular sobre seu trabalho e as publicações "são de responsabilidade exclusive de seus autores". No texto do artigo, Ferreira trata Judas Iscariotes como "o maior vilão da história" e "o amigo que traiu Jesus com um beijo".  

AMEAÇA A DEPUTADO: ABSOLVIÇÃO

A 3ª Turma Recursal da Seção Judiciária do Distrito Federal manteve a absolvição de um homem acusado de ameaçar o deputado federal Arthur Lira e de injuriar um atendente de telemarketing da Câmara dos Deputados. Os alegados delitos aconteceram em outubro/2021, através de telefonema do réu no serviço 0800 da Câmara. O juiz federal Francisco Alexandre Ribeiro escreveu na sentença: "A gravação da ligação revela um episódio de destempero e indignação, sem promessa concreta de mal injusto contra Arthur Lira, tampouco evidência suficiente de lesão à honra do atendente". O magistrado assegurou que "como profissional de atendimento ao público, deveria estar habituado a lidar com situações de conflito verbal.  

TRATAMENTO ODONTOLÓGICO

Uma paciente submeteu-se a procedimento ortodôntico para correção dentário, através de aparelho fixo. O tratamento demorou por dois anos e, em junho/2017, observou que tinha algo errado com o tratamento, porque não teve os resultados esperados. A mulher sentia dores e o quadro estético piorou. A sentença do juízo da 6ª Vara Cível da Comarca de Uberlândia julgou parcialmente procedente a ação, no sentido de condenar na indenização por danos materiais, estéticos e morais, por tratamento malsucedido. Em recurso a 20ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais deu parcial provimento ao recurso do centro odontológico, uma clínica conveniada e uma dentista. A turma manteve boa parte da sentença, no sentido de condenar as apelantes a custear as despesas com o tratamento para correção dos problemas realizados, a pagar indenização por danos morais de R$ 10 mil, mas retirou da relação a dentista, porque apenas técnica, e não era responsável pelo tratamento.   

Campinas/SP, 27 de abril de 2025.

Antonio Pessoa Cardoso
Pessoa Cardoso Advogados. 



SAIU NA FOLHA DE SÃO PAULO

Quem vai cuidar de mim? Preocupação com futuro atinge mulheres com e sem filhos

Especialista aponta que Estado deve providenciar serviços para mitigar desigualdades de gênero e classe

SÃO PAULO

"Acho que o primeiro e mais importante a se dizer sobre o futuro é que eu não tenho pretensão de ter filhos. E geralmente existe uma ideia de que no futuro os filhos cuidam dos pais, né?", diz a atriz Ana Hikari, 30.

Ana não é uma exceção: cada vez menos pessoas estão decidindo ter filhos, principalmente mulheres. É o que mostram as tendências globais de fecundidade, que, segundo o OWD (Our World in Data), ligado à Universidade de Oxford, caíram pela metade nos últimos 60 anos.

Tampouco o Brasil foge a essa regra. Em 1950, a taxa de fecundidade no país, calculada com a média de bebês nascidos vivos por mulher, era de 6,12, de acordo com o OWD. Em 2023, a mesma média caiu para 1,62.

Essa queda, combinada ao envelhecimento da população, passarou a preocupar governos e autoridades das mais variadas matizes políticas ao redor do mundo. Há a preocupação com os sistemas previdenciários, com a reposição da força de trabalho e até com uma suposta "transição racial" da população em alguns discursos de cunho eugenista que instam mulheres brancas a terem mais filhos.

A imagem mostra uma mulher amarela sentada em um ambiente interno, próximo a uma janela. Ela está usando uma blusa de gola alta e tem cabelo longo e liso, com franja. Ao fundo, há plantas verdes e uma vista para o exterior, com edifícios visíveis. A iluminação é natural, proveniente da janela.
A atriz Ana Hikari, 30, não pretende ter filhos e planeja uma velhice ao lado dos amigos -  Rafaela Araújo/Folhapress

No meio de debates sérios sobre a existência de uma "crise do cuidado"e propostas esdrúxulas, como a criação de uma medalha de honra para mulheres com mais de seis filhos —uma das ações avaliadas pelo governo de Donald Trump nos Estados Unidos—, está um contingente cada vez maior de pessoas, como Ana, lidando com a questão: quem vai cuidar de mim no futuro?

"Eu, até uns anos atrás, tinha uma ideia de que ia morrer cedo e estava ótima com esse pensamento, porque, para mim, é apavorante pensar na minha perda de autonomia" afirma Ana. Ela diz que hoje cuida da mãe, que tem 70 anos e passa por problemas de saúde, mas não pensa em ter filhos pensando nesse tipo de ajuda no futuro. "Se um dia eu decidir ter, não quero que seja isso que esteja na minha cabeça."

A atriz planeja uma velhice com amigos e tenta se programar com controle financeiro e cuidados com o corpo. "Eu tenho tudo resolvido, até seguro funerário pago. Se morrer amanhã, está tudo pronto", brinca.

O planejamento financeiro para a velhice não é uma preocupação apenas daqueles que não têm filhos. A diretora de marketing Denise Crispim, 46, e a filha, Sofia, 19, estudante universitária, têm cada vez mais conversas sobre o futuro.

No caso delas, a questão é viabilizar o cuidado a longo prazo para as duas, porque Sofia tem paralisia cerebral grave e precisa de cuidados para realizar tarefas do dia a dia. "Eu me preparo trabalhando muito, porque cuidado é muito caro e eu penso que preciso ter uma reserva financeira para a velhice tanto para mim quanto para a Sofia", diz Denise.

Ela diz que para as duas a questão do cuidado ficou mais presente nos últimos anos. "Eu comecei a pensar mais sobre isso depois dos 45, quando o corpo já começou a não responder da mesma maneira que antes, comecei a me sentir mais cansada", afirma. "E a Sofia, às vezes, fala sobre como ela queria depender menos de mim."

Denise é confiante de que Sofia se virará bem no futuro porque juntas sempre trabalharam a autonomia da estudante. "Eu nunca, por exemplo, escolhi a roupa dela. Eu ajudava a vestir, mas as escolhas são dela", diz. "Eu também espero que até eu ficar idosa ela já tenha uma estabilidade financeira própria, da carreira dela."

A mãe sabe, porém, que essa pode não ser possível para a maior parte das pessoas com deficiência grave — dados do IBGE mostram que uma em cada quatro pessoas com deficiência acima dos 25 anos não completou o ensino médio, e quase 20% é analfabeta.

"E o cuidado acaba caindo muito para as mulheres da família, e criando essa angústia como é que será o futuro, quando elas não só não conseguirem prover o cuidado, mas precisarem dele também", diz Denise.

A realidade é que a maior parte dos brasileiros não tem como arcar com o preço de serviços de cuidado no mercado privado.

Folha pesquisou orçamentos de casas de repouso para idosos em São Paulo. No bairro do Tremembé, na zona norte, é possível achar acomodação a partir de R$ 3.500 ao mês —quase duas vezes o valor de um salário mínimo. Já em zonas mais centrais e ricas da cidade, como os Jardins, o preço de um quarto individual pode chegar a R$ 16 mil mensais. Serviços de cuidador em casa, em empresas especializadas, também ultrapassam R$ 10 mil mensais.

"Eu não tenho dinheiro para ter uma cuidadora, e já tenho dificuldades motoras. Não sei como vai ser no futuro", diz a engenheira civil Odete Santos, 66. "Eu já tenho que olhar se onde eu vou tem escada, por exemplo, e não consigo mais tomar banho em pé", conta ela.

Odete tem um filho de 19 anos, mas diz que "é uma carga muito grande" pensar em responsabilizá-lo por seu cuidado. "Ele vai abrir mão da vida dele para cuidar de mim?"

Para a consultora de políticas públicas Lívia Merlim, que é especialista em gênero e cuidado pela London School of Economics, o Estado precisa providenciar serviços de cuidado para mitigar essas desigualdades de renda e gênero, tirando a questão do âmbito familiar —ou seja, de quem é capaz de receber cuidados de parentes, ou ter planejamento financeiro para comprar cuidado no mercado.

"Todo mundo vai precisar de cuidados em algum momento da vida, mas não necessariamente todos vão ser cuidados da maneira que deveriam ou da maneira que necessitariam de cuidados", afirma.

Ela defende que a Política Nacional de Cuidados, sancionada em dezembro, é um primeiro passo para que haja um melhor fornecimento desses serviços de forma isonômica. As ações concretas para a implementação da política ainda não foram divulgadas pelo governo federal.

A consultora também aponta para outra questão: ao mesmo tempo que serviços de cuidado pagos são caros demais para a maior parte da população, a força de trabalho que atua neles, majoritariamente feminina e negra, tem poucos direitos e remuneração baixa.

"É um enorme volume de trabalho que é feito todos os dias, principalmente por mulheres, especificamente mulheres negras, um trabalho que não é reconhecido e que não é valorizado", diz.