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domingo, 25 de outubro de 2015

ELEIÇÃO DIRETA É GOLPE!

O processo eleitoral para escolha da mesa diretora dos tribunais de Justiça é antidemocrático e atrasado, resquício do sistema implantado pela ditadura militar de 1964. Afinal, não se pode considerar democrático quem não busca nem respeita a vontade da maioria para escolha de seu comando político administrativo. 

O ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal, tão admirado pelos magistrados, por ter legislado em causa própria, quando impôs o auxílio moradia, deu a seguinte declaração:

“Nenhum juiz tem o direito de bater no peito e dizer que não liga para a opinião pública, porque todo poder emana do povo e em seu nome é exercido”. O ministro esclareceu que os juízes não devem ignorar a opinião pública e quando contrariá-la deve ser sempre a favor da sociedade, segundo publicação da Agência Brasil. 

Pois o Judiciário, através dos ministros e desembargadores, ignora a opinião pública, quando permite que a minoria, entre os magistrados, reúnem-se e escolhem, entre os cinco mais velhos, na carreira, o Presidente, Vice e Corregedor. Estes irão governar os juízes e os serventuários da justiça, liderando um universo de milhares de pessoas diretamente beneficiadas ou atingidas pelos seus atos. É a forma que se encontrou para a continuidade dos governos nos tribunais sem a oxigenação e renovação que tanto se reclama. 

A Associação dos Magistrados Brasileiros deflagrou a bandeira das eleições diretas desde o ano de 2012 e o presidente do Tribunal de Justiça da Bahia, representando anseio dos magistrados, propôs eleições diretas para escolha da diretoria da Corte, mas os desembargadores, na última sessão, 23/10, apresentaram os mais estapafúrdios argumentos para não discutir o assunto ou para rejeitar a Proposta. 

Uns asseguraram que a mudança, nesse momento, de eleição indireta para direta, caracteriza golpe, como se a implantação do novo sistema na Corte fosse ruptura à ordem democrática; outros invocaram a experiência “nefasta” das eleições no Ministério Público, motivação suficiente para desaconselhar as eleições diretas no Tribunal; alguns teorizaram sobre a impossibilidade da discussão da Proposta, porque não incluída em pauta, apesar de item constante no parágrafo de “outros assuntos”; alias, no mesmo dia, sem inclusão em pauta, discutiu-se e elegeu-se os três nomes do quinto constitucional; em muitos outros momentos, o Tribunal debateu e aprovou matérias administrativas sem incluir o tema na pauta do dia; essa prática é comum na Corte. Mais alguns objetaram que não estavam preparados para analisar o tema e precisariam de maior tempo para refletir, além da necessidade de saber o programa dos candidatos. 

Sabe-se que todos os desembargadores receberam em seus gabinetes a proposta de eleição, assim como a contraposta; a tese esteve sempre em discussão no Tribunal, nos gabinetes, nos corredores do Tribunal, na imprensa e em todo o meio jurídico, por muitos anos. Portanto, não constitui surpresa para ninguém, não necessita de reflexão coisa nenhuma, porque já houve amadurecimento do assunto, mesmo porque é o único órgão a continuar escolhendo sua diretoria através de eleições indiretas e com candidatos “biônicos”.

O projeto de administração dos candidatos à diretoria do Tribunal de Justiça da Bahia nunca esteve em discussão, porquanto os candidatos são imposição do sistema e eles não se sentem obrigados a dizer o que planejam, mesmo porque não tem meta alguma: são presidente, vice-presidente, corregedor e só isso. 

O assunto no meio jurídico é tratado há muitos anos e sempre que se aproxima a indicação da nova diretoria é invocado o conservadorismo dos tribunais para impedir a prática da regra democrática. Pesquisas mostram que os magistrados brasileiros apoiam as eleições diretas no percentual de 90%, apesar da resistência da cúpula, que prefere a predominância da idade sobre a competência. 

O Tribunal de Justiça de Roraima, em sessão histórica, desde o mês de junho/2015, por unanimidade, alterou seu Regimento e adotou a eleição direta para a escolha do Presidente e Vice; a Justiça do Trabalho de várias regiões modificaram seus regimentos para ampliar o número de desembargadores aptos a disputar os cargos de direção da Corte; o Tribunal de Justiça de Mato Grosso permite a eleição direta, estendendo o voto a todos os magistrados de 1ª e 2ª instância; o Tribunal de Justiça de São Paulo admite que qualquer desembargador pode concorrer, à direção da Corte, independentemente da idade; alias, o des. Celso Limongi foi eleito para o biênio 2006/2007 em desacordo com a retrógrada Lei Orgânica.

No Rio Grande do Sul vigorou o entendimento consensual de que mesmo os desembargadores que não integram o órgão especial podem candidatar à cúpula do Tribunal de Justiça. O desembargador Leo Lima, biênio 2010/2012, era o 9º da lista, mas foi eleito porque os mais antigos foram recusando a antiguidade. Vê-se o nível de conscientização dos magistrados gaúchos, diferentemente do que ocorre entre nós, quando se chega a alegar direito adquirido, golpe e outros subterfúgios. 

Por unanimidade, a Comissão Especial da Câmara dos Deputados, criada para debater sobre o tema, aprovou, no dia 22/10, o Relatório da PEC 187/2012, que institui a eleição direta nos tribunais, necessitando da ratificação do plenário da Casa e isso deverá ocorrer ainda nessa legislatura. 

Diante de todo esse quadro e exemplos de tribunais do país, causa estranheza os argumentos de alguns desembargadores da Bahia que arguem golpe, direito adquirido, necessidade de reflexão para não mudar agora o que está errado e que se sabe há muito tempo. 

Invoca-se a LOMAN, lei gerada na ditadura, mas não a Constituição para reprovar a eleição direta para os tribunais, porque essa interpretação não condiz com o histórico de nossas leis. Com efeito, a Constituição em vigor confere aos tribunais “competência para eleger os órgãos diretivos e elaborar seus regimentos internos” e, portanto, não há condicionamento à LOMAN, art. 96, I, a, porque norma de eficácia plena e de aplicabilidade imediata. 

Não se entende como o Juiz, agente público mais próximo da sociedade, incumbido de interpretar e aplicar a Constituição, presidir e declarar eleitos todos os membros dos Poderes Executivo e Legislativo pode submeter-se ao autoritarismo de ser alijado do processo eleitoral para escolha dos dirigentes de sua própria organização? 


Salvador, 25 de outubro de 2015.

Antonio Pessoa Cardoso
Pessoa Cardoso Advogados.

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