segunda-feira, 23 de junho de 2025

SAIU NA FOLHA DE SÃO PAULO

Camila Rocha

Doutora em ciência política pela USP e pesquisadora do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento

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Camila Rocha

Ataque de Trump ao Irã foi à revelia do povo americano

Mortes em Gaza podem ter sido só início de catástrofe maior para Oriente Médio e mundo


Mortes em Gaza podem ter sido só início de catástrofe maior para Oriente Médio e mundo

ataque liderado por Trump às instalações nucleares do Irã foi feito à revelia do povo americano. Além de não contar com a autorização do Congresso Americano, Trump desprezou não apenas a vontade da maioria dos eleitores norte-americanos como parte expressiva do Maga(Make America Great Again/Torne a América Grande Novamente), movimento que o apoiou em sua ascensão ao poder.

De acordo com uma pesquisa Economist/Yougov divulgada em 19 de junho, ainda que 50% dos americanos enxerguem o Irã como um país inimigo dos Estados Unidos, apenas 16% pensam que os militares americanos devem se envolver na guerra entre Israel e Irã. Sessenta por cento dizem que não deveriam se envolver e 24% não têm certeza. Os maiores índices entre aqueles que se opõem à intervenção militar dos EUA no Irã são entre democratas (65%) e independentes (61%). Porém, mesmo entre republicanos, os contrários à entrada do país na guerra são maioria (53%).

Um homem com cabelo loiro e pele bronzeada está falando em um microfone. Ele parece estar em um evento formal, com um fundo vermelho. O homem está expressando emoções intensas, com a boca aberta e um olhar focado.
Donald Trump anuncia ataque dos EUA a instalações militares do Irã -  Carlos Barria - 22.jun.25/AFP

Em 2015, o então presidente Barack Obama celebrou um acordo com outras potências mundiais. Obama afirmou que o acordo tinha como base a possibilidade de ter acesso 24 horas por dia às principais instalações nucleares iranianas e que "todos os caminhos em direção a uma arma nuclear estão cortados". Nessa época, 32% dos americanos se opunham à negociação dos EUA, a maioria eram republicanos.

Porém, agora, não é apenas a maioria dos republicanos "comuns" que se opõe à decisão de Trump. Steve Bannon, uma das lideranças mais influentes do Maga, é frontalmente contrário à intervenção dos Estados Unidos no Irã. Segundo a agência de notícias Reuters, no dia 18 de junho, Bannon pediu cautela em relação à união das forças armadas dos EUA com Israel na tentativa de destruir o programa nuclear do Irã na ausência de um acordo diplomático. Bannon disse aos repórteres: "Não podemos fazer isso novamente. Vamos destruir o país. Não podemos ter outro Iraque".

A guerra do Iraque foi um desastre em todos os sentidos possíveis. Além de mais 300 mil pessoas mortas, a intervenção americana permitiu a ascensão do grupo Estado Islâmico, que promoveu ataques terroristas em todo o Oriente Médio.

Embora o governo dos EUA tenha encerrado oficialmente a guerra no Iraque em 2011, as repercussões da invasão e ocupação tiveram um enorme custo humano, social, econômico e ambiental. Além disso, Joseph Stiglitz, ganhador do prêmio Nobel, e Linda Bilmes, professora de Harvard, estimam que US$ 3 trilhões dos contribuintes norte-americanos foram gastos para derrubar o ditador Saddam Hussein sob a falsa alegação de que seu regime estava fabricando armas de destruição em massa.

A despeito da catástrofe no Iraque, a indústria da guerra norte-americana continuou recebendo investimentos pesados do governo. De acordo com o projeto "Costs of War", da Brown University, em 2024, o governo Biden aprovou US$ 17,9 bilhões em assistência militar para Israel, soma que excede todos os valores históricos de ajuda militar aprovados para o país.

Agora, ao que tudo indica, as mortes na Faixa de Gaza, que já superam 55 mil, sendo a maioria de mulheres e crianças, podem ser apenas o início de uma catástrofe muito maior para o Oriente Médio e para o mundo.


 

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