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segunda-feira, 2 de abril de 2018

A ATENÇÃO COM A VÍTIMA OU COM O CRIMINOSO

O criminoso tem merecido toda a atenção dos Poderes Judiciário, Executivo e Legislativo, desde o auxílio reclusão, previsto na Constituição, um salário maior que o mínimo vigente no país, até os benefícios concedidos pela lei, a exemplo da progressão da pena, da penalização, quase sempre, aproximada do mínimo, do trabalho efetivo do CNJ na defesa dos presidiários e outras condescendências que lhe permite deixar a prisão em tempo inferior à recuperação do trauma sofrido pela vítima ou de familiares. Estudos mostram que o padecimento de um crime violento leva, no mínimo, oito anos para recuperação do abalo. 

É incompreensível o exagerado cuidado com o criminoso ou familiares, seguido do descuido total com a vítima ou seus familiares! 

Afinal o autor de um homicídio aplica uma pena perpétua aos familiares do morto, enquanto o criminoso, é privado da liberdade por poucos anos; se tiver dinheiro, poderá nem ir para cadeia, pois a prescrição está aí para beneficiá-lo. 

Os novos tempos, no Brasil, mostram crimes cometidos com frieza, com crueldade, sem arrependimento pela desgraça da vítima e de seus familiares. Os crimes hediondos, os estupros, os assassinatos, o tráfico proliferam fiado na impunidade; vivemos acostumando com essas atrocidades. Para punir o criminoso, não basta a mudança da legislação, mas indispensável a aplicação da lei e sua interpretação, visando proteger e beneficiar a sociedade, sem o ânimo voltado somente para agasalhar o autor do delito na sociedade que ele destrói vagarosa e premeditadamente. 

O estudo do processo é direcionado para o crime e para o criminoso sem, praticamente, qualquer alusão à proteção da vítima.

A banalização do crime causa sofrimento intenso aos familiares da vítima e o drama torna-se mais acentuado, porque não há, praticamente, assistência estatal nenhuma. Os defensores dos direitos humanos não podem nem devem atuar para criar obstáculos na punição dos autores de crimes hediondos, ou não; espera-se que sua atuação seja limitada à verificação da legalidade dos procedimentos judiciais, nos precisos termos das leis do país e dos valores consagrados pela sociedade. 

Não se compreende como envidar esforços somente para fiscalizar o exato cumprimento dos direitos dos bandidos, sem se voltar para a assistência psicológica, médica, social e financeira dos familiares da vítima do crime.

A legislação nacional estacionou com a Lei n. 11.690/2008, que alterou o art. 201 do Código de Processo Penal, consignando a obrigatoriedade de o “ofendido” ser ouvido e intimado do andamento do processo, medida que poucos juízes cumprem. Em dois parágrafos, 5º e 6º, faculta ao juiz se "entender necessário, poderá encaminhar o ofendido para atendimento multidisciplinar, especialmente nas áreas psicossocial, de assistência jurídica e de saúde, a expensas do ofensor ou do Estado”. No parágrafo seguinte autoriza o juiz a preservar a intimidade e vida privada do "ofendido". É letra morta de lei que não favorece a vítima e seus familiares. 

É muito pouco, principalmente quando se considera que, normalmente, os juízes não tomam a providência enunciada no § 5º acima; a maioria dos crimes não chegam aos tribunais e, portanto, não são judicializados; em mais da metade dos crimes não se descobre a autoria em virtude do desleixo do Estado com a devida assistência às delegacias, o que inviabiliza até a abertura de inquérito policial; por último, os dois parágrafos citados acima, não tratam de direito algum para os familiares da vítima. 

Nos crimes contra o patrimônio privado, os bens da vítima não voltam mais ao seu dono, porque o Estado não desenvolve qualquer ação imediata de recuperação dos bens expropriados com a força da arma. Toda a atenção estará voltada para o delinqüente. A tragédia da vítima, pela prática do crime, seguido do descaso das autoridades competentes, contrapõe-se com o cuidado dedicado ao transgressor. O descuido destrói a vida do primeiro e o desvelo com este não contribui para sua integração à sociedade. 

Reclama-se para o Brasil a Justiça Comunitária, já praticada em alguns estados americanos, onde a vítima é a peça prioritária, através de participação ativa da comunidade. No Seminário de Direito Ambiental e Sistema Judicial Norte-Americano, em Portland, Oregon, Estados Unidos, ao qual participamos, tomamos ciência do Tribunal do Circuito de Deschutes, que criou o Departamento de Justiça Comunitária, encarregado de cumprir as recomendações anotadas em resoluções, direcionadas para cuidar da vítima dos ilícitos penais. 

Merecem destaques algumas recomendações: disponibilizar um escritório de advocacia para prestar total assistência à vítima; ressarcimento de prejuízos patrimoniais; aconselhamento sobre eventual trauma, a exemplo dos crimes contra os costumes; abrigo temporário; a depender da vontade da vítima, encontro com o delinqüente, no qual são expostas as conseqüências da infração, danos materiais e morais. 

Como se vê, ao invés de procurar inteirar-se sobre a situação, necessidades de serviços indispensáveis para mudar o comportamento do delinquente, busca-se saber sobre a situação da vítima, o grau de sua dificuldade com a falta do arrimo de família e o que o delinquente precisa fazer para compensar o sofrimento a enfrentar.

Santana, 01 de abril de 2018.

Antonio Pessoa Cardoso
Pessoa Cardoso Advogados.

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